Sempre acreditei que a Ciência fosse a luz que iluminava as trevas do obscurantismo. Sempre acreditei que ela nos salvaria, nos salvaria de nós mesmos. Acreditava que chegaríamos a um ponto da História onde seríamos seres humanos melhores e civilizados, onde não existisse guerra ou fome. Como fui ingênuo, ingênuo e tolo. Agora eu vejo. Só lamento que tenha sido agora...
Quando criei a fórmula do gás sintético não pensava nisso, não pensava em nada além da aventura hercúlea do conhecimento de que estava participando. Para mim a Ciência era neutra, neutra e onipresente,como uma entidade divina e transcendental. Eu, como meus colegas cientistas, era um nobre sacerdote. Ledo engano. Estava mais para uma avestruz, com a cabeça enfurnada na terra.
De alguma maneira suspeitava das intenções do governo russo quando me ofereceram o projeto do gás sintético, mas deixei minha moral de lado, em nome da Ciência, em nome da luz, veja só! Por um tempo tentei me convencer de que não tinha feito nada de errado, que as decisões de utilizar o gás não eram minhas, mas a verdade é que eu sabia de tudo e fiz tudo. Não estava preocupado com as outras pessoas, mas com minha vaidade, meu objetivo de ser um renomado sacerdote da Ciência. O resultado está aí: 32 milhões de mortos na Criméia... Tenho 32 milhões de mortes no currículo...
O que será da minha vida de agora em diante? Viverei me explicando para todos que conheço? Me defendendo á todos? Assumindo minha culpa eme autoflagelando? Não sei, não sei o que fazer. Não aguento tanto peso nos meus ombros. A História me conhecerá como o açougueiro do gás. Não vou passar a imagem de inocente, pouparei a longa condenação dos tribunais. Essa noite tudo termina! Gostaria que terminasse comigo o gás, as mortes, tudo, mas não posso. Pelo menos eu terminarei essa noite!
Um tiro na escuridão do quarto silencia a angústia.
Muito bom o blog, estou lendo e divertindo-me com suas histórias a um bom tempo. :D
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