Um tribunal. Um homem está sendo julgado hoje. Seus ombros curvados, seu olhar perdido no chão, suas mãos entrelaçadas são o suficiente para percebermos que ele se considera culpado e acha que deve ser condenado. O juiz prepara sua mesa, lê os papéis, pigarra um pouco antes de começar. Então, mira o acusado, e inicia sua inquirição.
-O senhor sabe por que está aqui?
-Sim, Meritissímo.
-O senhor tem ciência de que sua vida está em jogo aqui?
-Sim, Meritíssimo.
Na sua voz, um misto de serenidade e culpa. O juiz olhava-o com uma certa inquietação, não podia entender o motivo de tanta serenidade, muito menos de culpa.
-Sr. M, código 12-4b, residente do complexo K, o senhor está sendo acusado de apertar o botão vermelho e com isso exterminar 36 mil vidas. Como o senhor se declara?
-Culpado, Meritíssimo.
Culpado? Já tinha ouvido isso antes, mas sempre quando o acusado era confrontado com as provas forense e não lhe restava outra saída. Esse homem, no entanto, já de antemão, se declara culpado! Será encenação? O juiz busca em seus gestos alguma prova de teatralidade. Seu olhar distante parece uma das mais dissimuladas, mas ainda não tem total certeza.
Por mais que queria investigar o estranho comportamento do reú, o juiz tem que proferir a sentença.
-Sr. M, o senhor está condenado por homicídio em massa. Será sentenciado ao botão vermelho. Algum último desejo?
-Sim, eu gostaria de falar uma coisa...
Era isso, agora ele encenará todo um teatrinho. O juiz agora entendeu seus planos: ele quer ser um mártir. Bem, vamos ver até onde ele levará isso.
-Pode falar.
Seus olhos ficam mais agitados, tentam olhar para o juiz, olhar para as testemunhas. Suas mãos estão trêmulas. Na certa, é o peso da morte, de sua morte.
-Eu... sinto muito.
Envergonhados seus olhos voltam ao seu limbo e o corpo parece ter voltado a sua tímida serenidade.O juiz friamente aperta o botão vermelho e o homem cai do alçapão. Não se pode ver onde ele caiu, mas podemos ouvir seus gritos de dor se dissipando e um ligeiro cheiro de queimado penetra no tribunal. Mais uma vez a justiça foi feita, conclui o juiz.
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